terça-feira, 26 de maio de 2009

Todos nós comemos moscas (James Berkley)

Estava no escritório, dentro daquele cubículo desgraçado. O barulho das teclas dos computadores era insuportável. Não a princípio, mas depois de dois anos enfurnado nessa salinha de paredes de compensado qualquer um enlouquece com os malditos barulhos rotineiros. Era hora de sair e me levantei, olhando ao redor e procurando pelo meu chefe. Não que eu quisesse vê-lo, queria mesmo era evitá-lo! No último mês o desgraçado me fez trabalhar todos os sábados!
Andei sorrateiramente, vez ou outra cheguei até mesmo a engatinhar, tentando ao máximo passar sem que me vissem. Até mesmo ignorei quando meus colegas se despediram, fingindo que não ouvi. E cheguei a achar que tinha me livrado, mas fiz a pior coisa que poderia ter feito. Me levantei, achando que o ambiente já estava livre da praga e... grande erro. Caí como um pato na armadilha, o maldito tinha ficado ali, bem no meu ponto cego naquele resquício de parede ao lado da porta! Ai, que ódio! No momento, bem no maldito momento em que me levantei para tentar conservar um mínimo de dignidade, ele me viu. O grande filho-da-mãe me viu e bradou o meu nome, vindo na minha direção com aquele sorriso canalha, aquele sorriso de quem vence uma disputa, mas não quer parecer convencido.
- Anna! – Tive vontade de socar a cara dele, mas era capaz que aquelas bochechas enormes engolissem a minha mão.
Sorri. Acho que foi o sorriso mais amarelo que já dei em toda a minha vida.
- Chefe! Mas que surpresa agradável... Não esperava vê-lo aqui, estava certa de que o senhor já tinha ido para casa.
- Quase fui, Anna. Sabe, cheguei a tirar o carro da garagem quando me lembrei da grande ajuda que você tem me dado nesses finais de semana e resolvi chamá-la para mais um sábado aqui conosco! Sei do seu grande amor pela empresa e fico muito feliz ao ver meus empregados dando duro. Ah, se todos aqui da empresa fossem como você, as coisas andariam mais rápido.
Se todos da empresa fossem como eu, o lugar certamente já estaria em chamas. Respira Anna, respira... Conta até dez. Um... Dois... Três... Quatro... Chefe desgraçado, o diabo tem um lugar especial no inferno para você! Senti o rosto avermelhar de raiva e rapidamente pensei em alguma coisa para disfarçar.
- Ah chefe, fico lisonjeada... É tão bom quando nosso trabalho é reconhecido. Pode contar comigo sábado, ficarei contente em vir trabalhar.
Mas que merda, Anna! Te coordena, mulher! Você não quer mais trabalhar nos sábados! Diga isso a ele, vamos, diga! Desembucha, coloca tudo para fora e... Não, não posso. Se eu colocar tudo para fora, esse homem sai daqui num saco preto.
- Até amanhã, então.
O velho gordo estúpido foi se arrastando como uma morsa para fora do prédio e eu fiquei ali, olhando aquela bunda pelancuda se afastando. Até se o meu chefe fosse um Rodrigo Santoro ou algo do gênero, mas não, tinha que ser o tipo do Jô Soares! Quem sabe amanhã eu não me afogo naquela banha toda...
Suspirei.
Não, não posso me afogar. Preciso do dinheiro para pagar o aluguel, comprar comida... Se bem que engolindo mosca desse jeito, o dinheiro para o rancho chega a ser dispensável...

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